domingo, 30 de setembro de 2007

do poema - fuga


estou sentada
e olho os minutos
atravessados nas pessoas.
olho-os quase descrente
de que o tempo não se desdobre
em palavras ou ações todo o tempo.

as horas são um conjunto ilógico
de pragmatismos, estatísticas,
cidades a desmoronarem,
humanos desencontrados.
o poema foge de nós
dentro da noite.

eu sei, estou sentada e vejo
a fuga para o lugar obscuro
que habitava, antes
que eu o chamasse.
mas há crianças exangues,
bombas, cadáveres.
há silêncio mortal em meio ao sangue.

estou sentada como se fosse imune
e o tempo falasse comigo
a contar-me histórias antigas
para me distrair.
distraio-me de mim mesma.
mas o tempo, o mundo,
batem à porta dos meus olhos,
sem piedade.

e o poema esconde-se
nalgum vão da vida
o poema e o sentimento de mundo.


silvia chueire

quinta-feira, 27 de setembro de 2007






















observo-te

observo-te à distância,
castigado pela angústia,
no esforço de esquecer
que um dia foste livre e amaste.

pensas:
é tarde, nesta idade,
no mundo atônito com a violência,
o amor parece ainda mais ridículo.

e pensas que esqueces tua fome.
e te enganas.

silvia chueire

sábado, 22 de setembro de 2007

não se esquece

não se esquece
o curto corte no tempo
quando o instante alça
vôo inesperado
e nos revela
um corpo e palavras
a resgatarem-nos do silêncio
da noite

silvia chueire

sábado, 15 de setembro de 2007

Do alto do amor

Freqüentemente me esqueço que o mundo
tem a idade do olhar dos homens
para as coisas e as mulheres,
como se fossem deuses, ou baú de brinquedos.
Que as mulheres vivem na oscilação lunar
pisando ora em lâminas,
ora na areia da praia,
em pequenas taquicardias,
a oferecerem o seio ao amante,
ou ao pequenino que alimentam
com olhos mansos.

Freqüentemente me esqueço
da aguda mortalidade nossa.
Nossa, de todas as criaturas,
transfiguradas em pó ou pedra
ou numa árvore qualquer,
sem solenidade.
Apenas porque um dia surge
depois de outro.

Freqüentemente me esqueço
e quero o teu corpo
para amá-lo, abrigar-me nele,
por ele me deixar amar
atravessada de prazer.
Acolhida por ti em luz,
alegria, música
- o desejo atendido,
a atender-te.

Porque do alto do amor
pouco me interessa a questão metafísica da morte,
ou da possibilidade de não estarmos aqui
se o tempo do olhar
não corresponde ao tempo físico.



Silvia Chueire

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Dizer


Diz o teu amor a tocar as pétalas
do fogo que nos lambe os olhos,
e nos enche a alegria de significado.

Diz a tua extrema delicadeza
ao segurá-lo nas mãos,
o medo atravessado no teu sangue.

Diz o teu desejo incendiado junto
ao teu afeto no oceano de palavras
que te ocorrem. Diz a língua que te fala.
Diz.

E me espera.
No mesmo lugar de sempre.



Silvia Chueire

domingo, 2 de setembro de 2007














murmuras

murmuras uma canção aos meus ouvidos
e os meus pensamentos estremecem
na percepção de que o mundo é mais
e as rosas não se explicam.

murmuras a canção
e sei:
é inescapável a viagem.

as águas turbulentas cristalinamente
tentadoras,
a me chamarem:
vem.

silvia chueire

  Caos   Pandemônio instalado; as pessoas agarram sua sanidade a correr rua abaixo.   Há uma cachoeira -de mentes – a galope n...